segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Adam Smith e Marx dialogam sobre o desmonte do capitalismo financeiro

Para seu conhecimento e conclusão.
Fonte: Seção "Economia", da Agência Carta Maior, de 30/11/2008

"O que aconteceu nos últimos 30 anos no mundo vai contra tudo o que tu e eu, como economistas e como filósofos morais, queríamos", diz Adam Smith a Karl Marx", num diálogo imaginado pelo professor Antoni Domènech, professor de Filosofia da Universidade de Barcelona. No diálogo, eles conversam sobre a situação do capitalismo, defendem a atividade econômica geradora de riqueza e criticam os parasitas rentistas que buscam o lucro a qualquer preço.

Antoni Domènech - Sin Permiso

O professor Antoni Domènech, catedrático de Filosofia Moral na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade de Barcelona e editor da revista SinPermiso, produziu um diálogo fictício entre Adam Smith e Karl Marx sobre a crise atual do capitalismo.

Karl Marx: Viste, velho, que esse menino, Joseph Stiglitz, anda dizendo por aí que o colapso de Wall Street equivale à queda do Muro de Berlim e do socialismo real?

Adam Smith: Não é para ficar contente, nem eu nem tu. E tu, menos ainda que eu, Carlos.

Karl Marx: Cara, por conta do suicídio do capitalismo financeiro, meu nome voltou a estar na moda; meus livros, segundo informa o The Guardian, se esgotam. Até os mais conservadores, como o ministro das finanças da Alemanha, reconhecem que em minha teoria econômica há algo que ainda vale à pena levar em conta...

Adam Smith: Não me venhas agora com vaidades acadêmicas mesquinhas post mortem, Carlinhos, já que em vida jamais te abandonaste a esse tipo de coisa. Eu falo num sentido mais fundamental, mais político. Nenhum dos dois pode estar contente e, te repito, tu menos ainda que eu.

Karl Marx: Sim, e aí?

Adam Smith: O “socialismo real” que se construiu em teu nome e não tinha nada a ver contigo. Pelo menos tu, sim, te identificaste como “socialista”. Eu, por outro lado, nem sequer jamais chamei a mim mesmo de “liberal”! Isso de “liberalismo” é uma coisa do século XIX (a palavra, como tu sabes, foi inventada pelos espanhóis em 1812), e vão e a atribuem a mim, um cara que morreu oportunamente em 1793. É ridículo!Como isso foi me acontecer?

Karl Marx: Já vejo por onde estás indo. Queres dizer que nem a queda do Muro de Berlim nem o colapso do capitalismo financeiro em 2008 têm muito a ver nem contigo nem comigo, mas que, ainda assim, nos jogam as responsabilidades?

Adam Smith: Exatamente. Mas em teu caso é pior, Carlos. Porque tu, sim, te disseste socialista. A mim pouco importa o “liberalismo”, qualquer liberalismo. Não há o que explicar a ti, precisamente um de meus discípulos mais inteligentes, que nem minha teoria econômica nem minha filosofia moral tinham nada a ver com o tipo de ciência econômica, positiva e normativa, que começou a impor-se nos teus últimos anos de vida, isso a que tu ainda chegaste a chamar “economia vulgar” e que tanto agradou aos liberais de tipo decimonônico.

Karl Marx: Claro, tu e eu ainda fomos clássicos. Depois veio essa caterva vulgar de neoclássicos, incapazes de distinguir qualquer coisa.

Adam Smith: Por exemplo, entre atividades produtivas e improdutivas, entre atividades que geram valor e riqueza tangível e atividades econômicas que se limitam a obter rendas não resultantes de trabalho (rendas derivadas da propriedade de bens imóveis, rendas derivadas dos patrimônios financeiros, rendas resultantes de operações em mercados não-livres, monopólicos ou oligopólicos). Nunca deixou de me impressionar a agudeza com que elaboraste criticamente algumas dessas minhas distinções, por exemplo, nas teorias da mais-valia.

Karl Marx: É evidente. Tu falaste repetidas vezes da necessidade imperiosa de intervir publicamente em favor da atividade econômica produtiva. Isso é o que para ti significava “mercado livre”; nada a ver com o imperativo de paralisia pública dos liberais e dos economistas vulgares, incapazes de distinguir entre atividade econômica geradora de riqueza e atividade parasitária visando ao lucro.

Adam Smith: Em meu mercado livre os lucros das empresas verdadeiramente competitivas e produtivas e os salários dos trabalhadores dessas empresas nem sequer teriam que ser tributados. Em troca, para manter um mercado livre no sentido em que defendo, os governos deveriam matar de impostos os lucros imobiliários, financeiros e todas as rendas monopólicas...

Karl Marx: Quer dizer, a tudo o que, depois de terem dado a mim por morto, e em teu nome, Adam, em teu nome!, se fez com que deixassem de pagar impostos nos últimos 25 anos. Haja saco!

Adam Smith: Haja saco, Carlos! Porque o que eu disse é que uma economia verdadeiramente livre, na medida em que estimulasse a riqueza tangível podia gerar - graças, entre outras coisas, a um tratamento fiscal agressivo do parasitismo rentista e da pseudo-riqueza intangível - amplos recursos públicos que poderiam ser destinados a serviços sociais, à promoção da arte e da ciência básica – que é, como a arte, incompatível com o lucro privado -, a estabelecer uma renda básica universal e incondicional de cidadania, como queria meu conterrâneo Tom Paine, etc. Vês, já, Carlos: eu, que não passei de um modesto republicano whig (1) de meu tempo, agora, se quatro preguiçosos, ainda que ignorantes, professorzinhos não me falseassem, e se lessem com conhecimento histórico de causa, até poderia passar por um perigosíssimo socialista dos teus. E te direi, e há de ficar entre nós, que, considerando o que temos visto, a tua companhia resulta bastante grata a mim...

Karl Marx: Na realidade, todo o teu conhecimento, como o de tantos republicanos atlânticos de tua geração, foi posto a serviço do princípio enunciado pelo grande florentino mal-afamado, a saber: que a liberdade republicana não pode florescer em nenhum povo que consinta com a aparição de magnatas e senhores [gentilhuomini], capazes de desafiar a república. E só assim se vê como a falsificação, em teu caso, é pior que no meu: o “socialismo real” abusou aberrantemente da palavra “socialismo”, dando cabimento ao regozijo de meus inimigos; mas tu nem chegaste a te inteirar sobre o que era esse tal de “liberalismo”!

Adam Smith: Quem não se consola é porque não quer, Carlos. O certo é que o que aconteceu nos últimos 30 anos no mundo vai contra tudo o que tu e eu, como economistas e como filósofos morais, queríamos. Olha esses pobres espanhóis, inventores do termo “liberalismo”. A ti e a mim importava sobretudo a distribuição funcional do produto social (isso a que agora tratam como PIB): pois bem, a proporção da massa salarial em relação ao PIB não parou de baixar, na Espanha, e seguiu baixando inclusive depois que o partido até há muito pouco tempo se dizia marxista voltou a assumir o governo em 2004...

Karl Marx: Sim, sim, um horror...Mas é que quando esses meninos supostamente me abandonaram por ti e passaram a se chamar “social-liberais” no começo dos anos 80, o que fizeram foi uma coisa que também teria te deixado de cabelo em pé. Observa que não só retrocedeu a proporção da massa salarial em relação ao PIB, senão que, na Espanha do pelotazo (2) e do enrichisez-vous (3) de Felipe González, o mesmo que na Argentina da “pizza e do champanhe” de Menem e em quase todo o mundo, os lucros empresariais propriamente ditos também começaram a retroceder também em relação aos rendimentos imobiliários, financeiros e as rendas monopólicas, no PIB...

Adam Smith: Como nos arrebentaram, Carlos!

Karl Marx: Não te desesperes, Adam. A história é caprichosa e, quem sabe seja melhor, agora, que comecem a nos levar a sério. Observa que acabaram de dar o Prêmio Nobel a um menino bem danado, que há anos estuda a competição monopólica e resgata Chamberlain e Keynes, esses caras que ao menos se esforçaram para nos entender, a ti e a mim, nos anos 30 do século XX, e que queriam promover a “eutanásia do rentista”...

Adam Smith: - Eu fui um republicano whig bastante cético, Carlos. Não vivi o movimento dos trabalhadores dos séculos XIX e XX e a epopéia de sua luta pela democracia. Não posso entregar-me tão facilmente ao Princípio Esperança (4) daquele famoso discípulo teu, agora, certamente, quase esquecido.

Tradução: Katarina Peixoto

Notas

(1) O Whig Party era o partido que reunia as tendências liberais no Reino Unido e se contrapunha ao Tory Party, dos conservadores. Whig (ou Whigs) é uma expressão de origem popular que se tornou termo corrente na designação do partido liberal no Reino Unido. Esta corrente contribuiu para a formação do atual Partido Democrata Liberal – Liberal Democrats. Também está presente em algumas vertentes do Partido Trabalhista inglês-Labour Party. É profundamente relacionado ao protestantismo calvinista, na sua forma presbiteriana, das sociedades escocesa inglesa. Tem origem nas forças políticas escocesas e inglesas que lutaram a favor de um regime parlamentar protestante: o Whig Party.

O Whig Party foi um dos partidos mais influentes no sistema parlamentar britânico até o fim da Primeira Guerra Mundial, alternando com os Tories na formação do governo britânico. Depois da Primeira Guerra, o partido perdeu importância e foi praticamente substituído pelo partido trabalhista (Labour Party) na alternância do poder político no Reino Unido com os Tories.
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_Whig_(Reino_Unido) N.deT.

(2) A cultura do pelotazo, na Espanha, refere-se ao enriquecimento rápido e sem esforço.

(3) Expressão atribuída historicamente a uma suposta afirmação do historiador e político francês François Guizot (1787-1874). Num contexto de restauração de forças conservadoras no poder francês, teria Guizot, segundo consta na tradição do anedotário político, expressado seu entendimento da agenda revolucionária de 1789. Consta que, logo após ter assumido a chefia efetiva do governo, por volta de 1840, ele pronunciou: “Esclareçam-se, enriqueçam, melhorem a condição moral e material da nossa França”. Para outros, Guizot disse isto: “Enriqueçam para o trabalho e para a indulgência e serão eleitores”, respondendo aos detratores do voto censitário. A expressão passou então a ser usada como descrição de um comportamento cínico e privatista, como parece ser o caso nesse diálogo. N.deT.

(4) O Princípio Esperança (editado no Brasil pela Contraponto) é o trabalho mais famoso de Ernst Bloch, de 1959. Sobre Bloch, são dignas de reprodução as seguintes considerações de Michael Löwy: “Teólogo da revolução” e filósofo da esperança, amigo de juventude de Lukács e Walter Benjamin, Ernst Bloch designa a si próprio como um pensador romântico revolucionário. Nascido na cidade industrial de Ludwigschafen, sede da IG Farben (Importante Empresa Química), olhava com espanto e admiração a cidade vizinha, Manheim, velho centro cultural e religioso; como dirá mais tarde numa entrevista autobiográfica, esse contraste entre “a aparência feia, despida e sem delicadeza do capitalismo tardio” - símbolo do “caráter-de-estação-de-trens” (Bahnfof-shaftigkeit) de nossa vida moderna e a antiga cidade do outro lado do Reno, símbolo da “mais radiante história medieval” e do “Santo Império Romano Germânico”, deixou uma profunda marca em seu espírito.

Leitor entusiasta de Schelling desde a adolescência, aluno do sociólogo neo-romântico (judeu) Georg Simmel, em Berlim, Bloch irá participar durante alguns anos (com Lukács) do Círculo Max Weber de Heidelberg, um dos principais núcleos do romantismo anticapitalista nos meios universitários alemães. Testemunhos da época o descrevem como um “judeu apocalíptico catolicizante”, ou como “um novo filósofo judeu...” que se acreditava, com toda evidência, precursor de um novo Messias./ Por essa época (1910-17), havia uma profunda comunhão espiritual entre Bloch e Lukács, de que é possível acompanhar os vestígios em seus primeiros escritos. Segundo Bloch (na entrevista que me concedeu em 1974), “éramos como vasos comunicantes; a água encontrava-se sempre à mesma altura nas duas colunas”. Foi graças a Lukács que ele se iniciou no universo religioso de Mestre Eckhart, Kierkegaard e Dostoiévski – três fontes decisivas para sua evolução espirital. ”In: Redenção e Utopia: o judaísmo libertário na Europa central (Um estudo de afinidade eletiva)”. Trad. Paulo Neves, São Paulo, SP, Companhia das Letras, 1989, p. 120). N. de T.

sábado, 15 de novembro de 2008

Movimento Proparque no Simpósio de Psicologia Ambiental


Fotos: Débora Vaz




















Apresentei dia 14 a experiência do Movimento Proparque no II Simpósio de Psicologia Ambiental da Unifor. Foram duas horas de exposição e debate de que participaram cerca de 30 alunos e professores da Universidade de Fortaleza. Junto comigo, Artur Bruno apresentou a Associação Amigos da Praça e Lívia Leorne discorreu sobre trabalho acadêmico junto a usuários da Praça do Ferreira, em Fortaleza.

Foi oportunidade para apresentar as conquistas e dificuldades do Movimento Proparque, as reações dos públicos à ação da entidade. Entre estes públicos, os moradores do bairro, os caminhantes do parque, as autoridades, a imprensa. Também foram abordados os métodos de trabalho da ong, sua posição de independência em relação a partidos, governos e religiões. Entre as conquistas, foram citados: maior número de caminhantes todos os dias, mais respeito pelo parque por parte da população, iluminação total do parque, pessoas cuidando de plantas, melhores equipamentos instalados pela atual administração da prefeitura.

As dificuldades são: relacionamento com técnicos e autoridades municipais, insegurança (a cargo do Estado), depredações, deposição de lixo, degradação até pelo método de varrer o logradouro, limites diminuídos e falta de definição do parque conforme a lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação.

Os presentes foram convidados para o Passeio Ecológico que o movimento fará à casa de Rachel de Queiros, em Quixadá, dia 7 de dezembro, e para a missa dia 2, no anfiteatro do parque, às 18h.

Não desperdiçar as oportunidades da crise

Leonardo Boff
Teólogo

Face ao cataclismo econômico-financeiro mundial se desenham dois cenários:
um de crise e outro de tragédia. Tragédia seria se toda a arquitetura
econômica mundial desabasse e nos empurasse para um caos total com milhões
de vítimas por violência, fome e guerra. Não seria impossível, pois o
capitalismo, geralmente, supera as situações caóticas mediante a guerra.
Ganha ao destruir e ganha ao reconstruir. Somente que hoje esta solução não
parece viável pois uma guerra tecnológica liquidaria com a espécie humana;
só cabem guerras regionais sem uso de armas de destruição em massa.

Outro cenário seria de crise. Para ela, não acaba o mundo econômico, mas
este tipo de mundo, o neoliberal. O caos pode ser criativo, dando origem a
outra ordem diferente e melhor. A crise teria, portanto, uma função
purificadora, abrindo espaço para uma outra oportunidade de produção e de
consumo.

Não precisamos recorrer ao idiograma chinês de crise para saber de sua
significação como risco e oportunidade. Basta recordar o sânscrito matriz
das línguas ocidentais.

Em sânscrito, crise vem de kir ou kri que significa purificar e limpar. De
kri vem também crítica que é um processo pelo qual nos damos conta dos
pressupostos, dos contextos, do alcance e dos limites seja do pensamento,
seja de qualquer fenômeno. De kri se deriva outrossim crisol, elemento
químico com o qual se limpa ouro das gangas e, por fim, acrisolar que quer
dizer depurar e decantar. Então, a crise representa a oportunidade de um
processo critico, de depuração do cerne: só o verdadeiro fica, o acidental
cai sem sustentabilidade.

Ao redor e a partir deste cerne se constrói uma outra ordem que representa
a superação da crise. Os ciclos de crise do capitalismo são notórios. Como
nunca se fazem cortes estruturais que inaugurem uma nova ordem econômica, mas
sempre se recorre a ajustes que preservam a lógica exploradora de base, ele
nunca supera propriamente a crise. Alivia seus efeitos danosos, revitaliza a
produção para novamente entrar em crise e assim prolongar o recorrente ciclo
de crises.

A atual crise poderia ser uma grande oportunidade para a invenção de um
outro paradigma de produção e de consumo. Mais que regulações novas,
fazem-se urgentes alternativas. A solução da crise econômica-financeira
passa pelo encaminhamento da crise ecológica geral e do aquecimento global.
Se estas variáveis não forem consideradas, as soluções econômicas, dentro de
pouco tempo, não terão sustentabilidade e a crise voltará com mais
virulência.

As empresas nas bolsas de Londres e de Wall Street tiveram perdas de mais de
um trilhão e meio de dólares, perdas do capital humano. Enquanto isso,
segundo dados do Greenpeace, o capital natural tem perdas anuais da ordem de
2 a 4 trilhões de dólares, provocadas pela degradação geral dos
ecossistemas, desflorestamento, desertificação e escassez de água. A
primeira produziu pânico, a segunda sequer foi notada. Mas desta vez não dá
para continuar com o business usual.

O pior que nos pode acontecer é não aproveitar a oportunidade advinda da
crise generalizada do tipo de economia neoliberal para projetar uma
alternativa de produção que combine a preservação do capital natural com o
capital humano. Há que se passar de um paradigma de produção industrial
devastador para um de sustentação de toda a vida.

Esta alternativa é imprescindível, como o mostrou corajosamene François
Houtart, sociólgo belga e grande amigo do Brasil, numa conferência diante da
Assembleia da ONU em 30 de outubro do corrrente ano: se não buscarmos uma
alternativa ao atual paradigma econômico em quinze anos 20% a 30% das
espécies vivas poderão desaparecer e nos meados do século haverá cerca de
150 a 200 milhões de refugiados climáticos. Agora a crise em vez de
oportunidade vira risco aterrador.

A crise atual nos oferece a oportunidade, talvez uma das últimas, para
encontrarmos um modo de vida sustentável para os humanos e para toda a
comunidade de vida. Sem isso poderemos ir ao encontro da escuridão.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

MCP Ocupa a SEMAM: mais um passo à frente

A elite de Fortaleza sempre controlou o território urbano e os recursos da cidade. Com isso concentrou muita riqueza ao longo de décadas. Nesta lógica do capital, o povo trabalhador sempre foi visto como mão de obra barata, por um lado, e um estorvo ao livre uso dos territórios pela elite, por outro. Um estorvo porque o povo tem que morar em algum canto e nem sempre as pessoas escolhem para ocupar áreas sem interesse econômico. Além de morar, os pobres ainda têm o desplante de utilizar certos territórios para seu lazer e sobrevivência. Por isso, entendemos que a luta de classes se materializa na disputa pelo espaço urbano e seus recursos naturais e estruturais. Nesse sentido o MCP vem amadurecendo num processo de construção coletiva em suas instâncias de base e de coordenação, um projeto de cidade apto a disputar a cidade palmo a palmo com a burguesia. E assim, discutindo com os filhos do povo que decidiram erguer sua voz, vamos refletindo o que queremos realizar na cidade e que iniciativas e ações nos levarão à vitória. Cada passo de um movimento enraizado e democrático se dá com dificuldades e num tempo político que é próprio do processo de auto-construção do movimento.

Há exatos quatro anos iniciávamos um processo de organização de massas que resultou na organização de dezenas de Assembléias Populares envolvendo milhares de pessoas, desembocando na grande Assembléia Popular da Cidade em abril de 2005 (com mais de três mil pessoas). Todos os setores da esquerda que participaram desse processo decidiram abrir mão de sua riqueza. Alguns por não entenderem ou não acreditarem que de fato o Poder Popular pode ser uma alternativa para nossa sociedade; outros por acharem que tinham coisas melhores, mais importantes para fazer. Há ainda um setor que apostou e trabalhou pelo fim do MCP. Porém alguns militantes foram teimosos e, diante da disposição de centenas de pessoas em comunidades e bairros populares de continuarem sonhando que sua vez chegará, muitas delas sem outra opção que não a luta para reverter as péssimas condições materiais em que vivem, o MCP continuou vivo. À margem dos centros de poder e dos holofotes dos meios de comunicação, lutas foram gestadas e seguiram seu curso. Lutas como a luta por trabalho, realizada com base em incontáveis reuniões e plenárias, resultando em várias manifestações e originando a criação dos grupos de produção em vários bairros.

A ocupação da SEMAM é mais um passo nesse processo. Não nos interessa ficar a reboque dos frenesis de cada momento conjuntural da política do espetáculo, e muito menos ficar atrás da melhor foto. Nos interessa avançar a pequenos passos no tabuleiro da luta de classes. No dia 04 de novembro demos alguns destes passos, e ora compartilho com os que nos apóiam o resultado da mobilização:

1- O principal resultado foi mais um avanço na consciência de classe e na disposição de luta das mulheres, jovens, homens e crianças que participaram da ocupação com garra e alegria.

2 – Praia Mansa – compromisso da Prefeitura em intermediar com a DOCAS o acesso à Praia Mansa para lazer das comunidades e turismo de base comunitária. (A Praia Mansa é proibida inclusive para aqueles que lá viviam e foram removidos para o Serviluz). Assim demos um primeiro passo na luta contra a construção do Centro de Convenções e na retomada dessa área pela comunidade que dela foi expropriada. Muitos episódios dessa luta virão pela frente.

3 – Ponte da Sabiaguaba – apesar de se abster de responsabilidade sobre tal empreendimento, a Prefeitura reconheceu que existe um amplo projeto para além da ponte que afetará as comunidades do entorno, bem como a necessidade de envolvê-las nas discussões. Nesse sentido um primeiro passo será dado pela Câmara que realizará Audiência Pública sobre o assunto. Para comunidades como Caça e Pesca e Parque Água Fria será a primeira oportunidade de conhecer oficialmente algumas informações e colocar posições. Será fundamental acumular forças e apontá-las pra cima do DNIT.

4 – A Semam, Regional 6 e vereadores farão visitas de fiscalização em empreendimentos imobiliários que estão sendo construídos na Lagoa Seca e às margens do Rio Coaçu.

5 – Compromisso do relator do Plano Diretor de que nenhuma emenda ao plano será apresentada em plenário sem discussão prévia com os movimentos populares;

6 – Foi recusado nosso pedido de suspensão de licenças até aprovação do Plano. Contudo tanto Semam como PGM reconheceram serem legítimas revogações de licenças de empreendimentos que não se adeqüem aos novos parâmetros; porém só analisarão os casos em que forem provocadas;

7 – O relator do plano diretor admitiu a possibilidade de transformar as dunas fixas da Praia do Futuro em ZPA (com índice zero para construção).

8 – Quanto à faixa de praia da Praia do Futuro a SEMAM defendeu a proposta do Projeto Orla (retirada dos empreendimentos), mas os vereadores acham que deve haver uma mediação, reafirmamos nossa posição de defesa do Orla e o debate continuará.

9 – Turismo de Base Comunitária – montar-se-á uma mesa entre MCP, Setfor e Semam para discutir formas de apoio da Prefeitura para iniciativas e projetos;

10 – Moradia: avançamos nas difíceis negociações que envolvem desapropriações e projetos de construções em várias áreas da cidade. Mais um passo a frente.... Outros terão que ser dados.

11 – Grupos de Produção: compromisso de liberação dos recursos já acertados em curto prazo.

Igor Moreira
Militante do Movimento dos Conselhos Populares (MCP)

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Pensamentos à deriva

Estive pensando: o que levaria um homem hebreu (ou mulher) escravizado(a) no Egito a alegrar-se com a eleição de um novo Faraó?

Há quem interprete como "sinal dos tempos" um negro dirigindo o império. Sei não...
O negro vai governar diferente do branco, em que?
O dólar agora tem a cor vermelha?
O império vai inaugurar a idade em que o lobo colabora com o cordeiro? A conferir. Afinal, disse o poeta, o tempo é o senhor da verdade.

Li em algum lugar que os jovens dos EUA não têm o menor entusiasmo pelas eleições que consideram um tédio só. Sabem que tudo está previamente decidido pelo poder econômico. Foi diferente agora?

Nesta eleição, predominou nos EUA o uso da mídia eletrônica. Sabem quem pensa assim, mandam o vizinho demover o tal daquele pensamento e enviam por meio eletrônico até os argumentos convincentes. Este, sim, é o big brother.

Obama prometeu retirar as tropas norte-americanas de alguns países. Vai mandá-las para qual novo endereço? Aguarde nas futuras edições de seu telejornal preferido.

Pessimista, eu? De jeito nenhum. Nem auto nem alien-enganado.

sábado, 1 de novembro de 2008

Movimento Proparque Entra no 14º Ano

Completamos dia 1º de novembro, hoje, 13 anos de atividades. Começamos o 14º ano com a sensação de vitória, por vários motivos:

* Permanecemos fiéis a nossa origem: a promoção de melhorias no Parque Ecológico Rio Branco.
* Continuamos tão independentes como no primeiro dia. Sem vinculação a partido, a político individualmente, a religião. E a todos recorrendo para conserguir as melhorias que têm vindo. Nem sempre na mesma proporção das reivindicações, mas têm vindo, graças à nossa independência.
* Conseguimos: iluminação, novos equipamentos, aumento no percurso da pista de cooper, o campo de futebol, área para projetos sociais (Hoje com o Projeto Crescer com Arte), retirada dos casebres e casas para as famílias em lugares sadios, mais brinquedos para as crianças, o anfiteatro, novas grades e portões, plantio de mudas, diversos eventos de educação ambiental, modificar o projeto original que tinha até quadra de tênis, adaptando-o à realidade dos usuários moradores nas imediações do parque e cujos equipamentos estão agora em término de sua instalação.

AINDA NÃO CONSEGUIMOS TUDO. Veja abaixo situações ainda persistentes e que precisam melhorar. Conforme a legislação em vigor, o projeto do Parque Ecológico Rio Branco precisa contemplar:
1. A reinclusão dos terrenos excluídos do parque pelos projetos de 2000 e 2002, de modo que a Unidade de Conservação volte a ter os limites originais de 1992, pois um decreto não pode desrespeitar uma lei;
2. Iluminação direcionada para o chão, em respeito às necessidades de aves que pernoitam no parque (as copas das árvores precisam ficar no escuro) e não exija corte de galhos;
3. Espaço para o Centro Popular de Cultura e Meio Ambiente Lauro Maia, para ser local de reunião da comunidade e referência em educação ambiental. Para isso, sugerimos a desapropriação de imóveis cujos muros limitam com o parque;
4. Bancos em círculo, que favoreçam o encontro e a conversa em pequenos grupos (Excelentes para serem usados também – não exclusivamente – durante cursos e trabalhos de educação ambiental, discussões da comunidade, cursos e treinamentos). A disposição atual dos bancos sugere apenas a contemplação, não, a conversa.
5. Espaço para instalação de lonas ou pequenos circos de projetos educativos, oficiais ou de ONGs;
6. Arborização, dando preferência à vegetação nativa, abatendo somente as árvores cujos problemas não possam ser corrigidos com correto manejo e que ameacem causar acidentes.
7. Áreas para feirinhas e exposições da comunidade.
8. Há necessidade de uma administração profissional e permanente no Parque, em três turnos e sete dias da semana, que possa prevenir, detectar e corrigir problemas, antes que se agravem. O parque tem 7 vigilantes e 10 trabalhadores de varrer o terreno e cuidar as plantas.
9. Residências construídas muito próximas às (ou sobre as) nascentes fizeram diminuir o corpo d’água do Riacho Rio Branco e de outros riachos dentro do parque.
10. A retirada da ocupação irregular conhecida como “Vila Manduca”.
11. Sanitários para o Público. Por inacreditável que pareça, os sanitários construídos pela Administração Municipal dentro do parque não são disponibilizados para a população usuária, constituída também por pessoas hipertensas que, durante as caminhadas, sentem necessidades fisiológicas que não podem ser atendidas e se vêem em situação vexatória.
12. Sede Digna para a Administração. Falta um espaço propício à convivência e ao descanso de funcionários do parque. O existente, próximo à entrada da Av. Pontes Vieira, é pequeno, desconfortável e conta com banheiro e sanitário precários.
13. É freqüente flagrar pessoas trafegando nas alemedas do parque de animal, automóvel, moto, carroça ou bicicleta. Funcionários da prefeitura entram de carro no parque, apesar de haver estacionamento na Av. Visconde do Rio Branco. Donos de cavalos e jumentos soltam no logradouro seus animais a pastar. Pessoas levam cachorros até de raças ferozes para passeios ali, sem equipamentos de proteção como focinheira.
14. É sabido, também, que o parque é usado para tráfico e consumo de drogas, embora ninguém tenha coragem de denunciar vendedores e dependentes, o que mostra a necessidade de uma ação da polícia especializada, para confirmar o fato e adotar providências. Mortes como a de 19.10.2008, em frente ao parque, comprovam esta informação.
15. É constante a quebra de grades, colunas, brinquedos, árvores, pontes e bancos, além da pichação de muros e colunas, bem como a queima de lixo e entulho.
16. Famílias e empresas localizadas em terrenos próximos ao parque direcionam para ele suas águas pluviais, o que provoca erosão constante das margens dos rios.
17. Nas podas e capinas, empresas terceirizadas eliminam espécies nativas propícias à arborização e ornamentação, quebram galhos de árvores antigas e matam suas mudas. É o caso das palmeiras de Macaúba e da planta Xanana (ou Chanana, nomes populares). Esta última é uma pequena planta endêmica, muito resistente, cuja flor creme desabrocha todas as manhãs.
18. Necessidade de Perícia Técnica. As observações e sugestões aqui apresentadas partem do olhar popular, portanto, não-especializado. Trata-se, porém, de uma visão essencial, por ser baseada no saber vivencial. Urge que a Secretaria de Meio Ambiente e Controle Urbano (Semam) da Prefeitura de Fortaleza faça uma perícia técnica no Parque Ecológico Rio Branco, para que sejam identificados estes e possivelmente outros problemas, para posterior correção, mediante projetos elaborados pela própria Semam ou por outros órgãos e secretarias do Município, para execução pela Secretaria Executiva Regional II (SER II) e Empresa Municipal de Limpeza e Urbanização (Emlurb).

ESCÂNDALO NA CÚPULA AMBIENTAL DE FORTALEZA E DO CEARÁ

Fórum Cearense do Meio Ambiente
Fortaleza, 1 de novembro de 2008


ESCÂNDALO NA CÚPULA AMBIENTAL DE FORTALEZA E DO CEARÁ:
PELO APROFUNDAMENTO E EXTENSÃO DAS INVESTIGAÇÕES, AFASTAMENTO DOS SUSPEITOS E PUNIÇÃO DOS CULPADOS


As entidades, movimentos e personalidades abaixo-assinados, em face dos últimos episódios que levaram à prisão dos principais dirigentes dos órgãos de controle ambiental do Estado do Ceará, a saber, o Gerente do Ibama, o Superintendente da SEMACE e a Secretária do Meio Ambiente do Município de Fortaleza, vêm tornar público que:

1. É função da Polícia Federal a investigação e apuração de crimes. Em nosso Estado, a apuração por crimes ligados à concessão ilegal de licenças confirma suspeitas já publicizadas pelo movimento ecológico, no que concerne à permissividade no processo de licenciamento;
2. Esperam e requerem que tais investigações sejam aprofundadas, com a
extensão das investigações para outros casos - já denunciados pelo movimento ambientalista - que podem também estar vinculados a processos de favorecimento, tráfico de influência ou corrupção;
3. Consideram que, dada a gravidade dos fatos em apuração, os gestores que se encontram sob investigação devem ser afastados de seus cargos, até o final da apuração, para garantir a tranqüilidade do procedimento investigatório e a moralidade da coisa pública, profundamente atingida por esses episódios;
4. Finalmente, são pela apuração rigorosa de todas as licenças concedidas na gestão dos servidores investigados, já que a atividade de licenciamento ambiental se encontra comprometida por completo, sob suspeição de corrupção e tráfico de influência.

Movimento SOS Cocó
Associação dos Geógrafos Brasileiros - AGB Fort
Instituto da Memória do Povo Cearense - IMOPEC
Movimento Pró-Parque Rachel de Queiroz
Movimento pela Revitalização do Pólo de Lazer da Sargento Herminio
João Alfredo Melo - Ambientalista, Vereador eleito Psol Fortaleza
Mardineuson Sena - Geógrafo, Professor da URCA
Grupo de Estudos Regionais - URCA
Magnólia Said - Advogada
Fórum Cearense por uma Nova Cultura das Águas
Antonio Ricardo Domingos da Costa Tapeba- Articulação dos Povos Indigenas no Nordeste, Minas Gerais, Espirito Santo
Maria Amélia Leite, Missionária, Associação Missão Tremembé-AMIT
Ana Maria Ferreira Cardoso - Ambientalista, doutoranda Educação UFC
Arnaldo Fernandes - Ambientalista
Anote - Agência de Notícias Esperança
Movimento Proparque
Movimento Pró-Parque Lagoa Itaperaoba
Fórum Cearense do Meio Ambiente

domingo, 26 de outubro de 2008

Greve dos Bancários Sugere que a Categoria é Descartável

Os que trabalhamos em bancos voltamos ao trabalho dia 24, após 17 dias de greve – nem todos, claro. Algumas considerações a meu ver pertinentes:

Apresentei e foi aprovada pela assembléia a sugestão de o Sindicato dos Bancários do Ceará promover um debate, estudo, mesa redonda, seminário ou evento similar sobre "que nova greve poderemos fazer, no atual ambiente tecnológico". Vale destacar que esta idéia eu já apresentara na greve de 2003 e repetira inúmeras vezes que fui a eventos no sindicato. Como não houve resposta, apresentei a idéia novamente e a assembléia aprovou jogar para depois da greve a discussão.

Por novo ambiente tecnológico entenda: internet, terceirização, auto-atendimento, interdito proibitório, lei de greve que impõe funcionamento de "percentual" de serviços. Mais: o velho "assédio". E, ao fim, a punição de pagar os dias parados. Em outras palavras: neste contexto, exercer o direito de greve mais parece um "rito formal e caduco". Pode-se fazer greve, desde que empresários e população não sintam falta de banco.

O ambiente mudou, o patronato afiou as garras e criou novas armas, porém nós ainda fazemos a greve dos anos 1980, útil para um ambiente tecnológico hoje ultrapassado. Parafraseando Chico Buarque, podemos concluir que "de tão usada, a faca já não corta" (Cálice).

Sugiro aqui fazermos uma "tempestade de idéias" com o objetivo de descobrirmos nova forma de fazer greve. Conversemos por e-mail. Quem quiser, use este blog ou meu e-mail ademircosta@ibest.com.br. Desta forma, você não corre risco por uso do e-mail da empresa. Quando (e se) o sindicato chamar para a discussão, já teremos acumulado alguma reflexão coletiva a respeito.

Nossas entidades ainda precisam "radicalizar a democracia" interna. Vi em prática nesta campanha salarial a velha máxima dos coronéis nordestinos: "para os amigos, pão; aos inimigos, pau".

Apenas 10 colegas podiam falar em cada assembléia. Cada investida da oposição recebia uma "cortada" vilenta da mesa diretora dos trabalhos. Quase tudo que vinha da assembléia era rejeitado pela mesa. Sentia-se uma barreira intransponível, pois a mesa estava com uma estratégia da qual não queria arredar. Lamentável. Penso, entretanto: se o Movimento de Oposição Bancária (MOB) atual estivesse no poder seria diferente? Lembrete: o sindicato de hoje é dirigido por membros do MOB de 20 anos atrás... (do qual fiz parte, embora como estrela de centésima grandeza. KKK!)

Há discurso novo no pedaço: alguns personagens novos disseram velhas verdades sem recorrer à agressão pessoal, indo mais à raiz dos problemas, dispensando chavões fáceis. Ainda bem! Esse pessoal promete.

Reflexão minha: o sindicalismo precisa colocar em primeiro plano o interesse dos trabalhadores. Jamais ceder à tentação de atender "também" a outros objetivos, embora nobres, mas que tiram o foco da questão sindical ou a enfraquecem. Nosso desatrelamento de partidos e de governos tem de ser a linha mestra do sindicato. Sempre.

Rola a suspeita ou acusação de que a CUT e seus sindicatos estariam demasiadamente alinhados com o governo Lula. É a isso que me refiro. Uma certa aproximação é compreensível. Lula é (ou foi?) o representante dos movimentos sociais do Brasil nas duas últimas décadas e de uma geração de sindicalistas. Esta geração sentiu-se "chegando ao poder" com Lula. A esta geração pertencem muitos da diretoria atual de nosso sindicato. Ainda assim, e principalmente após algumas "mancadas" de seu mandato, é necessária uma certa distância em relação ao governo, para criticá-lo, para pressioná-lo e trazê-lo para o lado dos trabalhadores.

Este tema é instigante. Quem quiser, opine. São idéias para discussão.

domingo, 19 de outubro de 2008

A Coragem de Dizer "Não"

Por
Ana Echevenguá e Renata Covalski

Homem e mulher são iguais perante a lei? Sim, claro! Peraí; quer dizer, nem tanto... Neste momento, em Santo André-SP, um homem (Lindenbergue) mantém em cárcere privado 2 mulheres (Heloá e Nayara, ambas com 15 anos de idade). Por quê? Porque Heloá decidiu romper o namoro. A coragem de dizer não despertou a ira de mais um “Pierrô Apaixonado” que, em nome do amor, sente-se no direito de prender, bater, matar... Mais um crime de amor? Bah! Que amor é esse? Aquele que "foge a dicionários e a regulamentos vários", na poesia de Carlos Drummond de Andrade?

O caso da Heloá é o exemplo da hora. Quantas vezes por dia as mulheres são vítimas da injustiça e da arbitrariedade? Em 2001, apuraram que 2,1 milhões de mulheres sofreram espancamentos graves no Brasil. Ou seja, a cada 15 segundos, uma mulher foi espancada no Brasil. Em 2008, o número deve ter triplicado.

É ou não é uma guerra silenciosa, geralmente travada dentro das 4 paredes do ‘lar, doce lar’? Provavelmente, alguns vão responder que a coisa não é bem assim... Ora, chega de tanta hipocrisia! A consciência, os direitos e/ou a moral feminina, para muita gente, ainda são considerados inexistentes. É, sim, uma guerra civil cuja violência real contra a mulher é fomentada pela indiferença da sociedade a esses crimes. E, também, pela cultura da impunidade dos agressores.

Na Idade Média, muitas foram consideradas bruxas, e queimadas em praça pública porque seu comportamento não agradou a classe dominante. Estamos no século XXI e a coisa parece não ter mudado: somos punidas – até com a morte - sem julgamento justo. E ao nosso algoz são concedidas várias atenuantes aos “crimes passionais” que comete, inclusive o direito à defesa da honra manchada.

Por quê? Porque a mulher ainda é vista como um objeto: uma cadeira que pode ser quebrada, um móvel velho que deve ser trocado por outro mais novo. Quando ela é um objeto sexual, recai sobre ela, SEMPRE, a responsabilidade dos crimes contra a liberdade sexual. No entender de alguns operadores do direito, ela seduz, induzindo o macho a cometer atos de violência e de abuso sexual.

E esta indução ao abuso sexual é alimentada pela mídia que geralmente expõe a mulher como o prazer sexual visual disponível no bar, no elevador, no local de trabalho, nas ruas... Basta analisarmos os anúncios de alguns produtos: o que fulmina o marasmo de um dia-a-dia de trabalho? A visão de garçonetes com corpos esculturais no boteco da esquina; um encontro com a “colega gostosona” no final do expediente... Os programas de televisão não fogem à regra: “mulheres gostosas” são apresentadas como burras e inocentes que incentivam ou aderem aos apelos sexuais do macho protagonista.

Apesar do surgimento das delegacias de polícia para as mulheres, os dados sobre a violência contra a mulher ainda não representam a nossa realidade. A Organização Mundial de Saúde apurou que cerca de 20% das mulheres são vítimas de violência física ou sexual durante a vida. Para a Anistia Internacional, esse número pode chegar a 33%.

Quantas mulheres têm coragem de denunciar um crime de estupro, por exemplo? Poucas. A dor, o constrangimento, o dano moral provocados pela agressão sexual é tão grande que algumas não revelam estas situações nem para as amigas mais íntimas. Gostariam de deletar da memória que um dia foram agredidas ou abusadas sexualmente. E carregam, em silêncio, traumas permanentes que geram mudanças de comportamento, até mesmo na vida sexual.

O pior disso tudo é que nós – mulheres - somos coniventes com esta situação. Acostumamo-nos com as agressões cotidianas; rimos das piadas machistas; cantamos ‘um tapinha não dói’; batemos palmas pra “artista” que posou nua na Playboy; como vivemos no país do turismo sexual, ficamos insensíveis ao vermos meninas entregues à prostituição, servindo de pasto sexual a “consumidores” estrangeiros com dinheiro no bolso.

Portanto, chegou a hora de dizer não ao medíocre papel de ‘objeto sexual’ que a sociedade nos impôs na novela da vida. Este não é o primeiro passo para garantir a integridade física e psicológica das nossas filhas, netas e de tantas outras mulheres que amamos...

Ana Echevenguá, advogada ambientalista, coordenadora do programa Eco&Ação, presidente da ong Ambiental Acqua Bios, e- mail: ana@ecoeacao.com.br. (48) 84014526 - Florianópolis, SC.

Renata Covalski, filósofa e pesquisadora, e-mail: renatacovalski@yahoo.com.br

Estelionato Eleitoral

Por
Adalberto de Alencar,
Educador

Qualidade e universalidade: como garantir os servicos públicos que a população necessita, tendo em vista a atual BASE ECONOMICA FRAGILIZADA nos municípios brasileiros??

Praticamente temos por encerradas as eleições municipais na grande maioria dos municipios brasileiros.
E o que podemos dizer é que, se tirarmos como média o que vimos pela televisão, não se discutiu os problemas reais de cada município.
Vimos um lado aqueles que estão nos Governos Municipais procurando os melhores marqueteiros para "mostrarem" o melhor que foi feito durante os ultimos 4 anos. Do outro lado uma "oposição", em grande parte, que não tem outro objetivo se não assumir os governos para reproduzirem, com uma outra logomarca e possivelmente novos fornecedores, a velha forma de administrar os municípios brasileiros -com pouca eficiência, endividamento público, corrupção e pouca geração de economia real-.
Todo mundo fazendo campanha e promessas SEM LASTRO FINANCEIRO. Sem âncora no orçamento municipal.
Um tremendo "Estelionato Eleitoral". O que se promete não tem condições reais de se cumprir. A eleição parece mais um conto de fadas. Lamentável é que milhões de brasileiros estão excluídos desta fantasia.
E a Crise Financeira Mundial? Não atinge a realidade dos nossos municípios??
O Brasil tem, hoje, boa parte de sua economia ancorada à economia Americana, que está em crise e começa entrar em um longo processo de recessão.
Venderemos menos para nosso maior importador. Isto significa menos emprego, menos economia, menos investimentos nos municipios brasileiros. O mesmo já comeca acontecer na Europa, nosso segundo maior mercado importador. Ou seja estamos chegando ao final de mais de uma década de aquecimento da economia capitalista. Desta forma as ações e os negócios irão diminuir de forma significante nos próximos anos. Em resumo: menos atividade econômica.
Hoje o turismo e os servicos empregam uma grande parte de brasileiros. Com a iminente recesssão e o desemprego, também este setor entrará em retração.
Menos emprego, menos economia, menos consumo, menos ICMS, menos Fundo de Arrecadação dos Municipios. Sem esquecer de falar da previsão de arrecadacao municipal, estadual e federal, que se reduzirá nos próximos anos. Nada disto se discute na eleição. Ao que parece, a elite política brasileira vive "um conto de fadas" que possue uma "varinha-máquina" para imprimir dinheiro para realizar sua obras fantasióticas.
O período de dinheiro fácil do governo federal, ao que tudo leva a crer, está por findar.
Temos ainda, para agravar mais a problemática, o financiamento da produção e do consumo que ficará mais caro com o aumento das taxas de juros.
Não dá mais para financiar a produção e o consumo com juros "subsidiados e sem lastro real" = Crise Financeira.
Os fundos de pensão - grandes investidores da economia atual -, perderão milhões nos próximos meses. Nossa dívida externa crescerá com o aumento das taxas de juros. Para os prefeitos e prefeitas eleitos, pareceu não ter importância a questão do custo da máquina administrativa, da eficiência na gestão, do combate ao desperdício e a corrupção. Ou seja, pareceu nao ser importante discutir e pensar numa forma mais barata, mais justa e mais correta de administrar uma prefeitura.
Temos um auto Custo-Brasil no que se refere as máquinas municipais.
Basta ver o relatório dos Tribunais de Contas dos Municípios apontando as irregularidades nas gestões públicas municipais.
Como financiar as necesidades de um município?? Como produzir uma economia real em cada municipio?? Como garantir qualidade nos serviços que a população necessita, tendo em vista a atual BASE ECONOMICA FRAGILIZADA nos municípios brasileiros??
Como escolher prioridades em um período de recessão??
Pelo que se viu, parece que esta agenda não faz parte das eleições e nem das prioridades dos atuais e futuros prefeitos.
Para alguns a saída será mais individamento, dinheiro do BID, Banco Mundial etc. Porém, até mesmo esta forma fácil de conseguir recursos diminuirá com crise financeira mundial, e a capacidade de pagamento de economias em recessão diminuirá.
Nossa sociedade parece estar tão pouco informada, e bem menos ainda consciente desta realidade econômica dos municípios.
Já temos grandes desafios em época de boa e estável economia: milhares de jovens que querem emprego; demandas de saúde; educação; habitação etc. Reflita-se: e agora, com recessão e crise financeira internacional??
NÃO, NÃO! ISTO NÃO DEVE FAZER PARTE DO DEBATE ELEITORAL E DA GESTÃO MUNICIPAL!!!!!
Os gestores públicos brasileiros já estão preparados, com uma varinha mágica para PRODUZIR UM NOVO MUNDO, UMA NOVA ECONOMIA!
Iniciamos uma crise dramática para milhões de traballhadores em todo o mundo, e em particular no terceiro mundo. Mas isto parece não fazer parte do mundo dos gestores municipais brasileiros. Ou seja, não fazemos parte desse "mundo"???
Eles só terão seus empregos ameaçados daqui há 4 anos. E um bom marqueteiro, com uma boa dose de poder econômico e articulação política, pode resolver o problema de ganhar as eleições. Mas, certamente, não resolverá a crise das economias municipais.


Adalberto de Alencar
Estocolmo/Suécia, 8 de outubro 2008

Mais uma Área Verde quer Reconhecimento

O Vereador eleito, João Alfredo, distribuiu entre seus amigos esta denúncia-convite que, aqui, reparto com você. É mais uma área verde de Fortaleza que pede respeito:

Prezado Vereador João Alfredo,
Fazemos este contato com você, através da professora Noêmia e da ambientalista e professora Vanda.
Somos da Associação dos Moradores Alphavillage, no bairro Luciano Cavalcante, e o maior desafio é proteger as Áreas Verdes do bairro, fato que, inclusive, levou à fundação desta Associação.
Pois bem, em julho deste ano ficamos sabendo, através de um telefonema anônimo, que a Prefeitura, em permuta por uns prédios do TRE na praia de Iracema, deu uma área institucional, e adjunto doou uma das maiores Áreas Verdes do bairro para o TRE, grande parte ainda Mata Atlântica, mesmo que não primária.
De lá pra cá, procuramos meios de reverter a situação, sem êxito. Assim, pois, aconteceu que em 11/10/08, um trator com sua imensa pá e vários caminhões invadiram não somente a área institucional mas também a própria Área Verde e co-meçaram a derrubar a mata nativa (incluindo uns 30 árvores,entre eles Paraíbas, Angelim Pretos, Sabiás, Vibórnias, etc, de mais de 5mts de altura e todo sem a permissão da SEMACE. (Não é sem motivo que iniciaram isto sábado de manhã cedinho). Nosso Presidente, Nico Brodnitz, impidiu "na marra" a continuação da derrubada e ganhamos tempo. Simultaneamente os professores de uma das escolas vizinhas se mobilizaram para apoiar nosso Presidente.
De passagem seja mencionado que esta Área Verde já foi pauta na última OP (Orçamento Participativo) onde foi votado, junto com duas das escolas, a favor de uma criação de uma área poli-esportiva, já que uma pequena área oferecia boas bases para isto.
Sr. Vereador, precisamos muito de sua ajuda, já que não conseguimos apoio concreto
Dos órgãos públicos, nem um advogado com coragem e benevolência para derrubar a mencionada permuta da área cerde.
Este é somente um resumo. Gostaríamos de encontrá-lo para traçar-mos juntos um plano de defesa desta Área de 40.000 mts2.
Podemos contar com seu apoio? De nossa parte o encontro no dia 21/10/08 às 10.00hs na Escola Micael está confirmado. Agradecemos desde já. Aliás, acabamos de receber um "convite" para aparecermos no TRE dia 21/10/08 às 15 hs.

Cordiais saudações.

Lilian Brodnitz

terça-feira, 14 de outubro de 2008

A Farsa do Direito de Greve

Estranho este direito de greve dos bancários: precisam deixar funcionando o auto-atendimento; a compensação não pode parar; nenhuma porta de banco pode ser fechada. As faixas deverão ser colocadas a dois metros da porta; As empresas estão usando a figura jurídica do "interdito proibitório", do direito rural, para impedirem que bancários façam piquetes. no Bradesco e em outros bancos particulares, quem usar o "direito de greve" será demitido, ameaça feita ontem por um gerente do Bradesco em Fortaleza. Juízes já foram em pessoa para portas de agências, a fim de fazê-las funcionar. Quanto empenho!!

Tem mais: os bancos oficiais estão cheios de terceirizados. A classe média acessa os bancos a partir de suas próprias casas. As metas abusivas tiram a saúde mental dos trabalhadores bancários.

Entretanto, os lucros de cada banco somam montanhas de milhões.

Até quando?

domingo, 5 de outubro de 2008

Dia da Ecologia, Dia das Aves. Junte-se a Nós

Em justa homenagem a Francisco de Assis, ontem foi o Dia da Ecologia. Hoje, ainda sob os fluidos do "pobrezinho de Assis", é o Dia das Aves. Com minha mulher Luísa Vaz, plantei ontem e hoje umas 10 árvores no Parque Ecológico Rio Branco. Para o mundo ficar melhor, para os pássaros terem abrigo e alimento. Para "co-mover" a praticamente reeleita Luizianne Lins a deixar Fortaleza mais verde neste Ceará onde predomina o semi-árido.

No Movimento Proparque, temos o Projeto Vejo Flores em Você, que incentiva "plante uma árvore e cuide dela".
* Precisamos de agrônomo para ajudar no projeto, pois carecemos de orientação científica, a fim de plantarmos a muda certa no lugar certo. É que o parque tem áreas úmidas e outras com pedregulhos, pois são entulho de construção.
* O projeto precisa de botânicos e biólogos, para identificar animais no parque, as plantas, e recomendarem o melhor manejo da área.
* Precisamos de outros profissionais que, com saber científico e vivencial, ajudem o Movimento Proparque a agir melhor na pressão aos poderes públicos, na mobilização do povo em torno do parque e na análise das melhores estratégias de potencializar nosso capital social.

Crendice Pura: Promessa de "Milagre"

VEZ POR OUTRA RECEBO MENSAGENS DE CRISTÃOS (ou não) COM UMA INTRODUÇÃO MELOSA, UM TEXTO PARA "VOCÊ ORAR BAIXINHO" E FINALIZANDO COM A PROMESSA DE UM MILAGRE, CASO EU A REPASSE PARA ALGUNS AMIGOS. HÁ UMAS QUE ACRESCENTAM AMEAÇA A QUEM QUEBRAR A CORRENTE. EIS A RESPOSTA QUE MANDEI PARA UM AMIGO:

Admiro sua boa vontade, mas não acredito neste tipo de corrente. Acho péssima tática para nós cristãos essa promessa de "milagre". É crendice pura. Não gera "das pedras filhos de Abraão". O milagre, depois da ressurreição de Cristo, é as pessoas serem solidárias com os tipos todos de excluídos. Este é "o milagre" que a fé em Cristo pode operar hoje.

Meu Deus Jesus Cristo não é um deus milagreiro. Tentado a fazer milagre, negou-se a ser manipulado. Ele exige sempre que façamos nossa parte. Ele exige nosso esforço, para transformarmos situações "com a ajuda dele". Ele não nos substitui. Alguns casos:
* Se aquele jovem não tivesse dado cinco pães e dois peixes, Jesus não teria o que dividir. - Ele divide o que nós damos. Não multiplica do nada. O verbo multiplicar é usado neste caso por mera ideologia introduzida na interpretação das palavras de Jesus;
* Se os leprosos não tivessem feito o caminho rumo aos sacerdotes, não teriam sido curados;
* Se o paralítico não tivesse feito o esforço, não teria andado;
* Se o cego não tivesse dito: "Que eu veja, senhor!", não teria visto;
* Se os homens não tivessem aberto o teto para colocar o paralítico na frente de Jesus, este não teria diso curado;
* Se Madalena não tivesse lavado os pés de Cristo com lágrimas...
* Se Nicodemos não tivesse procurado Jesus "debaixo da árvore"...
* Se pedro não tivesse olhado para o olhar de Jesus depois de negá-lo três vezes...
* Se a mulher que sofria de hemorragia não tivesse furado a multidão para tocar a roupa de Jesus,...
* Se os apóstolos não tivessem "lançado a rede" após noite de pesca fracassada...
* Se Paulo não perseguisse Cristo com convição, "de coração sincero"...
* Se o ladrão não tivesse feito aquele pedido na última hora, na cruz...
* Se Maria não tivesse permanecido fiel no nascimento e na cruz dele..., não teria visto sua ressurreição.

Desculpe, não quero "ensinar Pai Nosso a vigário", mas se não fizermos nossa parte, Jesus não intervirá. Respeitará nossa decisão. Com corrente ou sem corrente, ninguém "receberá um milagre amanhã", sem suor, sem "fé na vida, fé no Homem, fé no que virá".

Ademir Costa

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Calou-se Mais Um Intérprete dos Brasileiros Simples: Waldick Soriano.

José Lemos
Professor Associado na Universidade Federal do Ceará.
lemos@ufc.br.

Na semana passada o Brasil perdeu um dos seus grandes interpretes da música popular. Foi-se Waldick Soriano, que muitos da autodefinida elite cultural brasileira, de forma arrogante e hipócrita, insistem em não reconhecer a obra, como um retrato em cores vivas e autênticas da simplicidade da maioria dos brasileiros. Houve época no Brasil em que assumir que se gostava de ouvir músicas do tipo “dor de cotovelo” significava ser execrado pela aquela gente que se dizia ter “fino gosto”.

Admitir ouvir e gostar de músicas de cantores como Waldick Soriano era sinônimo de alienação para os “patrulheiros ideológicos” que apenas “reconheciam” manifestação popular se tivesse o tal do “engajamento político”, mesmo isso não significando coerência ideológica e postura ética. Assumir que se apreciava arte como aquela significava ser rotulado de “brega”. “Chique” seria ter “comportamento de vanguarda”, ainda que isto significasse, mais tarde, demandas pecuniárias compensatórias por aqueles “ideais” que os “vanguardeiros” diziam possuir.

Muitos desses “revolucionários” conseguiriam indenizações polpudas e aposentadorias generosas do Estado Brasileiro. Ressarcimentos que foram conquistados às expensas do suor de milhões de excluídos (os “bregas”) que não tiveram a mesma “desenvoltura”, e poder de “persuasão” daqueles que lhes condenavam o gosto musical que retratava o seu cotidiano. Por isso seguem sobrevivendo com renda minguada, enquanto que muitos dos “engajados chiques” foram definitivamente cooptados pelo sistema que diziam combater e hoje usufruem contas bancárias recheadas decorrentes do seu “envolvimento militante” do passado. Continuam com a pose de “paladinos do politicamente correto” e de serem “contra tudo isso que aí está”. Inclusive a arte de que os mais pobres gostam.

O Brasil, na sua diversidade geográfica e cultural, tem produzido artistas que conseguiram captar os sentimentos de uma época. Por isso, esses brasileiros precisam ser reconhecidos devido à sua capacidade de traduzir, na sua arte, um conjunto de sentimentos pulsantes de sua gente. Waldick Soriano foi um desses. Assim como o foram Lupcinio Rodrigues, Maísa, Altemar Dutra, João do Vale, Luis Gonzaga, Patativa do Assaré, dentre os que já nos deixaram. Continuam sendo o Roberto Carlos, Paulinho da Viola, Dominguinhos, entre outros que, felizmente, continuam cantando a sua arte.

Roberto Carlos também foi vitima desse patrulhamento num passado não muito remoto. Nada, contudo, que impedisse que a atual Prefeitura “engajada” de Fortaleza o contratasse, a peso de ouro, para fazer show este ano ao ar livre com direito a tietagem daqueles e daquelas que outrora o apedrejavam porque sua música era “alienada”. Nada como a proximidade de uma eleição para mudar “convicções arraigadas” e aguçar “despojamento público”.

Waldick Soriano conseguiu captar, com sua sensibilidade, e transmitir nos versos de músicas como “Torturas de Amor” a complexidade de sentimentos mal resolvidos, traduzidos com simplicidade, mas repletos de beleza poética. Esta música seria mais tarde resgatada na belíssima voz de Maria Creusa. Aquela Diva que nos anos setenta interpretou magistralmente com Vinicius de Morais, Tom Jobim e Toquinho algumas das músicas mais antológicas do cancioneiro brasileiro de autoria desses compositores.

Que outro cantor-compositor ousaria escrever uma música com o titulo “Eu não sou Cachorro Não”, cujos versos mostram a que ponto pode chegar um homem que quer conquistar o afeto de uma mulher? Histórias humanas vivenciadas por qualquer um, de qualquer classe social, com ou sem conta bancaria farta. A nossa vida sintetiza-se em sentimentos assim. Pessoas apaixonadas movidas pelo amor, pelo desejo, pelo tesão e pela ternura, na busca incessante de partilhar, com alguém, as suas aventuras e desventuras.

Nada nesta vida faria o menor sentido se não fosse assim. Um percentual pequeno de brasileiros pode usufruir disso de forma confortável. A maioria não consegue vivenciar sentimentos assim, protegida pelo conforto de uma acomodação confortável e de renda mais folgada. Nem por isso, contudo, deixa de experimentar, na plenitude e na exaustão, tais emoções. Esse era o público mais fiel à arte de Waldick Soriano. Talvez por isso ela era recebida com nariz retorcido por aqueles mais bem posicionados na pirâmide social.

Waldick Soriano foi-se como se foi João do Vale, quase esquecido. João do Vale que teve a sua obra reconhecida por ninguém menos do que Chico Buarque que tentou resgatar-lhe, em vida, a sua arte para a população brasileira. Brasileiros que são atualmente bombardeados por “músicas” horrorosas veiculadas nas rádios (principalmente nas FM) e nas televisões, grande divulgadoras de baboseiras no Brasil. Como dizia o nosso Belchior (outro esquecido), “Nossos ídolos ainda são os mesmos”. Mas estão passando. Como passaram Harrison, Lennon, Elvis, Elis Regina, Nara Leão, Clara Nunes, Zequeti, Candeia... Waldick cantou o que as pessoas simples gostam de ouvir e de sentir, e que o tinham como um autêntico porta-voz, por isso a grande empatia entre ele e o seu público.

sábado, 13 de setembro de 2008

Governo Admite Ter Ignorado Parecer dos Técnicos sobre Rio Madeira e Ministério Público Federal Abre Inquérito

Por
Patrícia Bonilha
Local: São Paulo - SP
Fonte: Amazonia.org. br
Link: http://www.amazonia.org.br
Data: 12/09/2008

"Houve de fato o parecer dos técnicos, mas depois o parecer do diretor foi
outro" - reconheceu o presidente do IBAMA, Roberto Messias Franco, após ser
questionado repetidamente pelo plenário do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) a respeito das razões pelas quais - apenas três dias após
receber parecer contrário à concessão da Licença de Instalação para a usina
de Santo Antônio - a mesma foi liberada sem explicações a respeito da
mudança de opinião do órgão.

A afirmação de Messias Franco se deu no contexto de uma sessão especialmente dedicada a esclarecer as alegadas irregularidades no processo de licenciamento das duas usinas do Rio Madeira, para a qual foram convocados IBAMA, FUNAI, Ministério da Saúde, MPF e a OSCIP Amigos da Terra - Amazônia Brasileira. Na mesma sessão, o representante do MPF leu um ofício encaminhado pelo procurador Heitor Alves Soares que anuncia ter instaurado inquérito para apurar as razões pelas quais foi desrespeitado o laudo técnico conclusivo.

A discussão no CONAMA viu as ONGs de todas as regiões do país atacarem duramente o governo. "O governo Lula - ao ignorar a presença dos índios isolados na área de impacto da obra - está os condenando ao genocídio", afirmou a representante das ONGs da região Norte, Neidinha Bandeira, de Rondônia. Zuleica Nycz, representante da região Sudeste, AMA lamentou o fato de que o presidente do IBAMA se esquivou de responder à maioria das perguntas dos conselheiros, prometendo mais detalhes depois, por escrito. "Nessa altura precisamos de um painel de acompanhamento formado por
especialistas de renome para apurar realmente o que aconteceu com esse
licenciamento", afirmou.

As ONGs se valeram também de uma assessora técnica, Telma Monteiro, que apresentou dados sobre aspectos negligenciados pelos estudos, tais como a retirada das toras de madeira que descem o rio e diversas questões relacionadas com os sedimentos. Todos os ministérios foram chamados pela Casa Civil a defender o processo de licenciamento das usinas na reunião, em alguns casos com efeitos indesejados: o Ministério de Minas e Energia, por exemplo, arriscou oferecer explicações a respeito do processo, admitindo assim ter interferido no mesmo contratando estudos em lugar do IBAMA, o que é contrário aos procedimentos legais.

Já o governo de Rondônia, apesar de não questionar o licenciamento, admitiu ter reservas sobre o fato que não foram estudados os impactos sociais após a obra,
prevendo o que chamou de "ressaca depois da atração de 40 mil empregos diretos".

De acordo com Roberto Smeraldi, diretor de Amigos da Terra - Amazônia Brasileira, o processo gera três preocupações: uma com os impactos ambientais, que já acontecem (por exemplo, a explosão do desmatamento), uma sobre o fato que a justiça acabará suspendendo as obras durante a construção (com impactos econômicos) e outra diz respeito a criar um precedente de "licenciamento político" em detrimento dos pareceres técnicos.

O CONAMA decidiu suspender qualquer encaminhamento sobre o tema até o recebimento das explicações por escrito por parte do IBAMA.

Patrícia Bonilha

Assessoria de Comunicação
Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais
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Brasília - DF, CEP 70333-970
++ 55 61 3321-6108
Fax: ++ 61 3321-2766
skype: pbonilha
www.rbrasil.org.br

sábado, 6 de setembro de 2008

Água e Saneamento São Bens Vitais

Por
José Lemos
Professor Associado na Universidade Federal do Ceará. Autor do Livro “Mapa da Exclusão Social no Brasil: Radiografia de Um País Assimetricamente Pobre”. lemos@ufc.br.


No “Corão”, livro sagrado dos muçulmanos, está escrito: “Através da água nós proveremos a vida para tudo”. Na Bíblia dos cristãos também são constantes as passagens que mostram a importância da água para a vida. O Relatório de Desenvolvimento Humano da ONU (RDH) de 2006, um documento de 420 páginas, tem metade do seu conteúdo dedicado para avaliar, analisar e mostrar a importância do acesso à água e ao saneamento para o desenvolvimento humano. Na pagina 6 desse relatório lê-se a seguinte passagem: “água e saneamento estão entre os mais poderosos instrumentos de medicina preventiva disponíveis para os governantes reduzirem doenças infecto-contagiosas. Investimentos nestas áreas eliminam doenças como diarréia, cuja prevenção significa salvar vidas”.
Há uma forte relação entre exclusão social e falta de acesso à água e ao saneamento. A ONU estima que das 6,7 bilhões de pessoas que hoje povoam o mundo, dois (2) bilhões não tem acesso a esses serviços. Esta entidade prevê que 30% da população da terra não terá água de qualidade em 2025 e que 1/3 não terá instalações sanitárias adequadas. As maiores carências estarão nos grotões da África, Ásia e América Latina.
Nos locais onde não tem água, são as mulheres e as crianças que a buscam nas mais diversas e longínquas fontes. Em Moçambique e em Uganda, as mulheres chegam a alocar até 15 horas diárias do seu tempo na busca de água para as suas casas. É bastante comum as mulheres caminharem até 10 quilômetros semanais nesses paises em busca de água durante os períodos de estiagem. As crianças pobres que precisam buscar água para prover as necessidades das suas famílias têm um custo adicional que é o de não poderem freqüentar a escola, porque no horário das aulas estão se deslocando para a fonte de coleta de água, como se depreende do depoimento de uma menina de 10 anos de idade no local chamado de El Alto que fica na Bolívia: “naturalmente que eu gostaria de estar na escola. Eu quero aprender a ler, escrever e também gostaria de estar lá com os meus colegas. Mas como eu poderia? Minha mãe precisa de mim para apanhar água e o local onde se busca água apenas funciona de 10 a 12 horas. Tenho que chegar cedo para conseguir um bom lugar na fila, porque muitas pessoas vêm para cá em busca de água” (RDH, 2006).
Este depoimento, que arrepia pela sua dureza, também poderia ser dado por uma criança do Maranhão ou do Ceará. Da Paraíba ou de Alagoas. Do Piauí ou da Bahia. Poderíamos ouvi-lo em qualquer rincão deste Nordeste. A falta de instalações sanitárias dignas é coadjuvante. Não dispor delas significa conviver com promiscuidade e com doenças. Assim, as famílias que moram nos domicílios mais pobres sem saneamento e água limpa estão mais vulneráveis a vários tipos de doenças.
Nos períodos de estiagem, em que as populações do Nordeste são abastecidas pelos carros-pipas, as populações pobres, que precisam recorrer a essa fonte de abastecimento, têm uma despesa extra com a compra da água. Na estiagem do ano passado (2007), por exemplo, no município de Salitre no Ceará, um dos mais carentes desse Estado, o preço de um vasilhame de 20 litros de água chegou a ser comprado por R$ 10,00. Ou seja, os pobres ainda têm que despender parcela significativa da pouca renda que auferem para comprar água a preços exorbitantes em épocas de maiores dificuldades.
Atualmente no Brasil estima-se que 16% da população, ou 30,4 milhões de pessoas, não tenham acesso à água encanada, e 30%, ou 57 milhões de brasileiros não disponham de destino adequado para os dejetos diários. As regiões mais carentes, em termos relativos, são o Nordeste, com 51% da população sem saneamento adequado; e o Norte, onde a ausência de saneamento penaliza 48% da população. Nessas regiões também estão os maiores contingentes populacionais com privações de água de qualidade. Paradoxalmente na região Norte, onde estão os maiores reservatórios de água doce do planeta, 44% da população não têm acesso à água de qualidade nos domicílios. No Nordeste este percentual é de 25%. O desdobramento dessas carências mostra que elas são muito mais acentuadas nas áreas rurais de todo o Brasil. O mapeamento também sinaliza que em estados como Alagoas, Piauí, Maranhão, Paraíba, Acre, Rondônia e Ceará as situações são muito mais difíceis. Não é por acaso que esses estados lideram o ranking brasileiro detendo os maiores percentuais de socialmente excluídos e possuindo os menores padrões de desenvolvimento humano. Prover saneamento e água de qualidade para uma população em crescimento contínuo é o grande desafio deste milênio no mundo. No Brasil e no Nordeste o desafio não é menor.

Publicação simultânea com O Imparcial, de São Luís do Maranhão.

sábado, 30 de agosto de 2008

STF Suspende Julgamento de Raposa Serra do Sol

Por
Marco Antônio Soalheiro
Repórter da Agência Brasil
(http://www.agenciabrasil.gov.br)

Brasília - Após apresentação do voto do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Ayres Britto, que deu parecer pela manutenção da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol (RR) em área contínua, o ministro Carlos Alberto Menezes Direito pediu vista do processo.
O presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, disse que pretende retornar com a ação ao plenário "se possível ainda neste semestre".
Em seu voto, o ministro Ayres Britto rejeitou argumentos de suposta falsidade do laudo antropológico e proliferação estimulada de comunidades. Segundo o ministro, são nulas as titulações conferidas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a não-índios, pois as terras "já eram e permanecem indígenas".
Britto argumentou que, em Roraima, há terra em abundância para toda a população do estado. "Tudo em Roraima é grandioso. Se há, para 19 mil índios, 17 mil quilômetros quadrados, para uma população de menos de 400 mil não-índios há 121 mil quilômetros quadrados."
Logo após o pedido de vista, Ayres Britto voltou a comentar seu voto e reforçou seu posicionamento favorável à demarcação contínua. "Só a demarcação pelo formato contínuo atende os parâmetros da Constituição, para assegurar aos índios o direito de reprodução física, de reprodução cultural, de manter seus usos, costumes e tradições. A mutilação, com demarcação tipo queijo suíço, fragmentada, inviabiliza os desígnios da Constituição."

Algumas Reflexões para Debater um Projeto Para São Luís

Este artigo traz sugestões para a capital do Maranhão, mas, com adaptações, podem ser adotadas em outras cidades.


Por

José Lemos

Professor Associado na Universidade Federal do Ceará.

lemos@ufc.br

Estamos novamente em período de eleições no Brasil, em que pretendentes de todos os perfis fazem muitas promessas tentando seduzir os eleitores. Nessa busca de votos, observa-se que a maioria dos candidatos utiliza lugares comuns e frases prontas. Respaldados por “marqueteiros”, dizem o que imaginam ser o que o eleitor quer ouvir. Alguns, evidentemente, conseguem se eleger, e ao assumirem os respectivos mandatos “esquecem” o que foi prometido nos palanques. Este comportamento tem levado os políticos brasileiros a serem nivelados por baixo, e o exercício de mandato eletivo, que é fundamental para a democracia, vem caindo na vala comum do descrédito.

Com a experiência de alguns anos de Academia, e nesse período ter produzido trabalhos que tentaram entender as causas da pobreza e como fazer para mitigá-la é que resolvi explicitar algumas idéias. Não há a pretensão de ser dono da verdade nem de trazer projetos acabados. Há apenas a intenção de disponibilizar para a sociedade da terra com a qual mantenho vínculos fortíssimos de responsabilidade social, alguns conhecimentos que adquiri na vida. Pesa também o fato de ter participado da equipe do ex-Governador Zé Reinaldo que criou e executou um conjunto de ações que ajudou a retirar o Maranhão da estagnação social e econômica em que se encontrava na virada deste milênio.

Como demonstramos em artigo do dia 2 de agosto deste ano neste espaço, São Luis entrará em 2009 com 26% da sua população, ou 260 mil pessoas, socialmente excluídas. Estima-se um déficit habitacional entre 65 mil e 75 mil imóveis. Obviamente que as prioridades devem ser reduzir drasticamente esta divida social que inclui também reduzir o percentual de excluídos, levando àqueles ainda privados desses serviços, água encanada, saneamento, coleta de lixo e reduzindo-lhes a taxa de analfabetismo.

São Luís precisa aumentar e preservar a sua área verde. O próximo prefeito poderia liderar um grande mutirão para arborizar a cidade. Isto poderia ser feito de forma simultânea através da expansão e da introdução de novas áreas de preservação permanente, mas também através de projetos de arborização de curto, médio e longo prazo. Existem espécies arbustivas e arbóreas que tem maior precocidade, e que no primeiro momento seriam plantadas com maior densidade. Assim o planejamento envolveria o plantio escalonado de espécies frutíferas e ornamentais com diferentes períodos de crescimento

As reservas do Rangedor e do Itapiracó poderiam ser transformadas em parques ou Jardins Botânicos. Esta ação deveria ser feita em sinergia com o Governo do Estado, de tal forma que as espécies que fazem parte daquelas reservas seriam identificadas com nomes científicos e vulgares, e assim também tendo utilidade didática. Dentro desses parques seriam construídas trilhas ecológicas por onde as pessoas poderiam fazer passeios, exercícios aeróbios e praticar esportes. Ações que deveriam ser complementadas com a construção de logradouros públicos para o lazer das famílias, sobretudo nos seus bairros mais pobres. Tudo isso junto tornaria a cidade mais humanizada.

O patrimônio cultural e arquitetônico de São Luis é muito rico e diversificado. Logradouros como as Praças Deodoro, João Lisboa, Pedro II e todo o Centro Histórico precisam ser revigorados, haja vista que as ações até aqui realizadas não foram suficientes e por isso precisando de projetos mais arrojados. Todo aquele conjunto arquitetônico deve ser resgatado em sua harmonia para deixar a cidade mais bela para a sua gente e para quem a visita. Poderia ser trazido de volta o bonde elétrico para fazer um circuito turístico pelo centro, saindo da Praça João Lisboa, descendo a Rua Afonso Pena e passando pelo Mercado Central, que também precisa ser revigorado. A Prefeitura se uniria à iniciativa privada e promoveria, sistematicamente, eventos culturais nesses logradouros resgatados visando atrair a população da capital e os turistas, e assim injetaria efervescência naqueles espaços atualmente pouco freqüentados até por falta de motivações com essas.

Através da Secretaria de Agricultura Municipal, que deveria ser criada, o município trabalharia junto com o Estado e entidades do terceiro setor prestando assistência técnica aos agricultores familiares na construção de um “cinturão verde” no entorno da capital. Esses agricultores familiares deveriam dispor de diferentes espaços para negociarem diretamente com os consumidores em São Luis. Venderiam os seus produtos por preços remuneradores e os consumidores da capital, sobretudo os de baixa renda, teriam produtos de qualidade sendo comprados a preços abaixo daqueles praticados nos supermercados e nas demais feiras livres. Essas feiras de agricultores familiares teriam como vantagem adicional funcionarem como reguladoras dos preços de hortaliças e frutas nos mercado da capital, trazendo-os para baixo. Ficam as sugestões para aqueles que buscam ser prefeito da capital refletirem e se apropriarem, se acharem que vale a pena.

Artigo publicado simultaneamente pelo jornal O Imparcial, de São Luís do Maranhão

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

MANIFESTO DE APOIO A JOÃO ALFREDO VEREADOR

Nós, professores e ambientalistas de Fortaleza, temos o sonho de construir uma cidade bem diferente do que ela hoje é: pretendemos e lutamos por uma cidade socialmente justa, ecologicamente sustentável, culturalmente desenvolvida. Para isso, aceitamos o desafio de tecer e construir uma nova cultura política, que seja socialmente libertária, ambientalmente responsável e culturalmente elevada, voltada para todas as camadas que perfazem o tecido social urbano.
Essa nova cultura política, que se encontra em pleno processo de maturação e crescimento, exige uma outra cultura ambiental, que trate a questão ambiental como elemento estruturante de uma nova forma de viver, na qual o consumismo, o desperdício ambiental e a superexploração do meio ambiente e dos homens e mulheres não se façam mais presentes. Essa nova cultura política recusa a idéia de crescimento econômico a qualquer preço,
sobretudo quando esse preço é imposto às camadas mais simples da população. A nova cultura política que queremos trabalha na perspectiva da educação pública de qualidade, libertária e construtiva, para todos os
segmentos sociais. Ela prega ainda a radicalização da democracia com participação popular, e a luta contra a injustiça, a pobreza e as desigualdades sociais de toda ordem.
Na atualidade, a cidade de Fortaleza apresenta um grave quadro de degradação sócio-ambiental, sendo também marcante a fragilidade dos seus meios de produção, geração e desenvolvimento de conhecimento, educação e
cultura. A destruição ambiental na nossa cidade anda de mãos dadas com o poder econômico, com o rebaixamento da democracia a um mero procedimento eleitoral, com uma desagregação social explicitada pela violência urbana, pela banalização da vida, pela ausência de convivialidades humanas e com a progressiva destruição do mundo do trabalho. É neste cenário que emerge a necessidade peremptória de uma representação política diferente, que fortaleça o processo de busca e construção dessa nova sociedade que
queremos. Nós, professores e ambientalistas de Fortaleza, entendemos que a presença que fará a diferença na Câmara dos Vereadores é do ambientalista e professor João Alfredo.
João Alfredo é militante do movimento ambientalista há 25 anos. Durante todo esse período, manteve-se atuante, combativo, coerente, comprometido com todas as grandes e pequenas causas ecológicas e socioambientais da cidade e do estado. Tendo sido deputado estadual e federal, conhece os mecanismos de funcionamento do sistema legislativo brasileiro e sabe com eles agir, ao rejeitar toda as formas de maniqueísmo, corrupção e rebaixamento da representação popular. Por ser professor, é comprometido com os anseios de melhoria do processo de ensino-aprendizagem na cidade, que permeiam os nossos sonhos. Assim, nós, professores e ambientalistas abaixo assinados, apoiamos João Alfredo para vereador de Fortaleza. Porque a vida pede coragem!


ASSINAM O DOCUMENTO (por enquanto)

ADEMIR COSTA -- JORNALISTA E AMBIENTALISTA
SORAYA VANNINI TUPINAMBÁ- AMBIENTALISTA
VANDA CLAUDINO SALES - AMBIENTALISTA E PROFESSORA DEPTO GEOGRAFIA UFC
JEOVAH MEIRELES - Ambientalista e Prof. Depto. de Geografia da UFC
JOÃO SARAIVA – ambientalista
MARIA AMÉLIA – militante da causa indígena
URIBAM XAVIER – Prof. Depto Ciências Sociais UFC e Diretor da ADUFC
GIGI CASTRO - CANTORA E AMBIENTALISTA
ARNALDO FERNANDES - AMBIENTALISTA E MILITANTE SOCIO-AMBIENTAL
ZACHARIAS BEZERRA - AMBIENTALISTA E JORNALISTA
FLÁVIO TELLES MELO – PROFESSOR DE FILOSOFIA
CÉLIA GUABIRABA – ambientalista e integrante do IMOPEC
FÁTIMA GUABIRABA – ambientalista e integrante do IMOPEC
MAGNÓLIA SAID – ambientalista e advogada
FERNANDA RODRIGUES - Cientista Social e Doutoranda em Sociologia -UFC
FELIPE DOS REIS BARROSO - advogado e professor universitário
MARIA LOURDES DOS SANTOS - Doutoranda Sociologia UFC e ambientalista
ANA PAULA RABELO, Linguista
NILO SÉRGIO ARAGÃO - Professor de história
REGINA LÚCIA FEITOSA DIAS – ambientalista
ÂNGELA PINHEIRO - Professora da UFC
RAQUEL RIGOTTO – Proa Medicina da UFC
MARIA DO CÉU LIMA - Profa. do Departamento de Geografia da UFC
JOSAEL LIMA Lima - Ambientalista
RENATA NERIS VIANA - Professora
ROGÉRIO COSTA - Psicólogo e ambientalista
CLARISSA TAVARES - Jornalista
JOÃO B.A. FIGUEIREDO - Professor da FACED - UFC
EDSON VICENTE DA SILVA (Cacau) - Prof. do Depto. de Geografia da UFC
EUSTÓGIO DANTAS - Prof. do Depto. de Geografia da UFC
ALEXANDRA OLIVEIRA - Profa. do Depto. de Geografia da UFC
ANTONIO JOSÉ CUNHA – ambientalista e integrante do IMOPEC
NADJA MARIA DE MORAIS SOARES – ambientalista e integrante do IMOPEC
LOURDES CARVALHO NETA – geógrafa e professora da FAC
MARIA ELIA SOARES – geógrafa e professora da FAC
FABIANA FREIRE - médica anestesiologista e ecologista)
ELIZABETH GUABIRABA - Jornalista, fotógrafa e ecologista).
EUDES MOREIRA – Professor de Biologia
TIBÉRIO CÉSAR – Professor de Geografia


Seminário Sobre Agrotóxicos em Quixadá, Ceará

Comunicação da Profa.
Raquel Maria Rigotto

Com a greve dos trabalhadores da Delmont, que abriram uma janela para a sociedade enxergar o que acontece num empreendimento como este e de quê desenvolvimento se trata, encontramos a região do baixo Jaguaribe realmente com novos ares, como profeticamente foi batizado o nosso Seminário sobre agrotóxicos pela Soraya.
Contamos com mais de 300 pessoas nos três dias de trabalho - auditório da FAFIDAM lotado de estudantes do CENTEC, da própria UECE, professores da rede pública, profissionais de saúde, lideranças de ONG e movimentos sociais, trabalhadores. As exposições e os debates foram construindo naquele coletivo um olhar ampliado sobre as transformações em curso naquele território, contexto em que se agrava o problema da contaminação ambiental e humana pelos venenos. Os depoimentos dos trabalhadores, que romperam com o medo apesar das 170 demissões realizadas pela Delmont no dia 21.8, colocaram a história viva no palco e mexeram com as pessoas e instituições.Assim como a fala e o vídeo da comunidade de Lagoa dos Cavalos, do Esplar, das Bananeiras, mostrando que existe um caminho sustentável sendo trilhado por eles, como já adiantara o Prof. Hidelbrando, ao realçar os trunfos do vale.
Ao final, a comissão de encaminhamentos propos a constituição de um Fórum Permanente, composto pelas entidades que organizaram o evento - Ministério Público Estadual, Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos–FAFIDAM, Cáritas, Núcleo Tramas/UFC, Diocese de Limoeiro, Via Campesina, Articulação do Grito dos/as Excluídos/as da Diocese de Limoeiro do Norte, Instituto de Educação e Política em Defesa da Cidadania - IEPDC, Esplar, CENTEC, 10ª CERES- Limoeiro do Norte. Representantes dos estudantes e outras entidades/movimentos poderão aderir. Este Fórum debaterá também as propostas surgidas durante o Seminário e encaminhará.
Entre estas propostas está o envio de uma carta ao Ministério da Saúde, propondo que a região seja incluída nas prioridades de projeto sobre os impactos da transposição do São Francisco sobre a saúde da população. E também para incluir a região como piloto do Plano de Ação Integrada em Vigilância dos Agrotóxicos, que também está sendo preparado pelo Ministério da Saúde.
Paralelamente, tivemos reunião com autoridades públicas do setor saúde dos municípios de Limoeiro, Quixeré e Russas, na presença das Dras. Sheila Pitombeira e Bianca Leal, promotora pública de meio ambiente em Limoeiro. Foram definidos alguns encaminhamentos para ajudar os municípios na tarefa de controlar a contaminação/qualidade da água consumida pelas comunidas da Chapada, e para implantar as ações de saúde do trabalhador e vigilância ambiental no SUS, num esforço conjunto.
Pudemos ainda iniciar o estudo do caso de um dos trabalhadores - Sr. Valderi, bem como anotar contatos com outros trabalhadores, colher informações preciosas sobre os agrotóxicos utilizados e as condições de trabalho, manifestar apoio aos trabalhadores grevistas e aos demitidos, apoiar a negociação das demissões, pela feliz coincidência da chegada na cidade da Promotora do Trabalho, Dra. Hilda Leopoldina, para participar do Seminário; boa cobertura da imprensa = Diário do Nordeste... Enfim, muita luz!
Entre as tantas pessoas que ajudaram nestes avanços, ficam aqui agradecimentos especiais à Soraya e à Pastora, da Cáritas de Limoeiro, mães de boa parte destas luzes.
Atenção, agora, ao movimento dos trabalhadores lá.


A Autora:
Raquel Maria Rigotto
Profa. do Departamento de Saúde Comunitária
Núcleo TRAMAS - Trabalho, Meio Ambiente e Saúde para a Sustentabilidade,
da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará

Está faltando o “marco regulatório do lixo”

Por

Ana Echevenguá

Toda a atividade econômica gera trabalho, renda e... resíduos que, muitas vezes, provocam danos irreversíveis ao meio ambiente e à saúde humana. A pirita – lixo do carvão mineral – jogada ilegalmente no solo e água de Santa Catarina, pelos Senhores do Carvão, é uma exuberante prova disso.

E você? Está cuidando do seu lixo? A pergunta é endereçada tanto para quem produz o lixo doméstico como o industrial, o hospitalar... Se você está provocando danos com o seu lixo, a Lei 6.938/1981, que dispôs sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, obriga você, "independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros afetados pela sua atividade". Viram? O espírito desta lei é bem claro: poluiu, pagou/reparou.

Ah! Se essa e outras leis fossem cumpridas, teríamos outro Brasil! Está comprovado que a destinação e tratamento correto dos resíduos reflete diretamente na sadia qualidade de vida de todos os seres vivos.

Mas o Brasil, apesar da Constituição Cidadã e da abundância de leis (que não são cumpridas), acha que precisa editar uma que trate especificamente da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Por quê? Porque há uma corrente de pensamento que defende o seguinte: o gerador do lixo só vai fazer a coisa certa quando surgir uma nova legislação federal que aponte diretrizes para tanto, que trate de concessão de incentivos fiscais e financeiros àquele que promova o gerenciamento eficiente do seu lixo. Enfim, ele só vai cumprir a sua obrigação de manter o meio ambiente ecologicamente equilibrado quando o Brasil tiver uma lei que preveja o “marco regulatório do lixo”.

Há tempos, o Congresso Nacional acumula vários projetos sobre este assunto que não se transformaram, ainda, em lei. Uma novela que já conta com 17 longos anos! No momento, está em pauta o projeto de lei 1991/2007, elaborado pelo Poder Executivo, que juntou vários projetos sobre o lixo e encontrou adeptos para fazê-lo virar lei. Mas não temos acesso a quaisquer documentos sobre as propostas encaminhadas ao Grupo de Trabalho sobre Resíduos Sólidos da Câmara dos Deputados. Sequer sabemos se tais propostas ou críticas serão aproveitadas.

Gente, o Brasil desconhece a dimensão do problema do seu lixo. Não existem estatísticas oficiais a respeito. Ninguém sabe ao certo quanto se produz, como se transporta, quanto se trata e qual a destinação final do lixo. Sabe-se, tão somente, que há uma produção anual de 61,5 milhões de toneladas de resíduos urbanos; que 59% das nossas cidades colocam seu lixo em lixões; que apenas 7% dos nossos municípios contam com algum tipo de coleta seletiva de lixo. Para quem não sabe, o Brasil tem 5.563 municípios.

Até o inventário sobre o lixo-Brasil carece desse tal de “marco regulatório”. Não é piada!

Ora, sem o “marco regulatório”, sem as diretrizes da gestão nacional do lixo, por que o poluidor vai gastar com destinação e tratamento do seu lixo? O ingresso de cada tonelada de lixo em um aterro sanitário representa saída de dinheiro do caixa da empresa. Pra que gastar com isso se a falta do “marco regulatório” é a desculpa perfeita para jogar o lixo que produz em qualquer lugar, até na porta das nossas casas.

Enquanto este poluidor gera renda (para si) e lixo (para os outros), ele espera, sem qualquer pressa, que surja uma nova lei, protetiva dos seus interesses. Esta lei deve estabelecer, para o lixo que ele produz, a responsabilidade compartilhada entre a sociedade, a iniciativa privada e o Poder Público. Ou seja, ela deve garantir a socialização dos custos do seu lixo entre governo, consumidores, comerciantes e produtores.

Como não poderia ser de outra forma, a CNI - Confederação Nacional da Indústria – abraçou este modelo compartilhado. Dentre as diretrizes da Política Nacional de Resíduos Sólidos, o PL 1991/2007 já prevê uma “articulação entre as diferentes esferas do Poder Público, visando a cooperação técnica e financeira para a gestão integrada de resíduos sólidos”.

E o que nós – pobres mortais – sabemos do conteúdo deste projeto de lei? Sabemos se ele protege nossos interesses? Se ele prevê regras que melhorem a nossa saúde ambiental? Ou isso é um assunto que não nos interessa?

O grande ambientalista Gustavo Cherubine, ao discorrer sobre o tema, sugeriu que cada Estado provocasse uma audiência pública em suas Casas Legislativas para apresentar e discutir o PL 1991/2007. E citou o exemplo do Estado de São Paulo que, em julho de 2008, promoveu debate na Assembléia Legislativa Estadual, com a presença das Cooperativas de Catadores e com representantes da mobilização social envolvida com a necessidade de uma política séria para o caos dos resíduos sólidos.

Boa idéia, caro Gustavo. Vamos provocar nossos eleitos para uma conversa franca sobre o assunto! E vamos exigir que eles defendam os nossos interesses. Eu não quero pagar pelo tratamento do lixo produzido pelas indústrias, pelos hospitais, pelo restaurante da esquina da minha casa... isso é encargo deles.

Mas, ainda que este projeto vire uma lei boa para a sociedade em geral, não esperem milagres! A Lei 11.445/2007, que estabeleceu o tão esperado “marco regulatório do saneamento básico” e a política federal de saneamento básico, não mudou o panorama vergonhoso sobre a falta de tratamento de água e esgoto. Nada saiu do papel. E isso implica elevados custos socioeconômicos e ambientais para o Brasil.

Ana Echevenguá, advogada ambientalista, coordenadora do programa Eco&Ação, email: ana@ecoeacao.com.br - www.ecoeacao.com.br - (48) 84014526 - Florianópolis, SC.

MANIFESTO DAS ORGANIZAÇÕES SOLIDÁRIAS AO POVO TRUKÁ

Compartilho para que possamos ampliar nossas reflexões, aproveitar as experiências mútuas e crescer em solidariedade.

"Morre o homem, mas não morrem os sonhos" (Neguinho Truká)

"A exemplo de Xicão Xukuru, o sangue das lideranças indígenas que escorrem fecundam a terra e faz nascer novas lideranças" (Zé de Santa – Vice-Cacique Xukuru)

Uma intensa tristeza se abate sobre todos os povos do Nordeste: foi brutalmente assassinado, no dia 23 de agosto de 2008 mais uma grande liderança indígena Truká: Mozeni Araújo. Este dia é mais um dia de sangue para o povo Truká. Mozeni Araújo foi abatido covardemente na cidade de Cabrobó por um pistoleiro, a crime de mando, em razão da luta histórica de seu povo pela efetivação de seus direitos. O assassinato é mais uma tentativa de fragilizar, fragmentar e desarticular o processo de organização dos povos indígenas. Mozeni exercia um papel primordial de ponderação, como facilitador, nos momentos de resolução de conflitos nas lutas enfrentadas e sua morte é resultado de uma ação premeditada, que busca silenciar a voz Truká.

Os Truká, no arquipélago de Assunção na cidade de Cabrobó, vêm se organizando há mais de 70 anos para retomarem seu território e concretizarem o sonho dos seus ancestrais. Esse processo de retomadas se inicia na década de 80 e se acelera na década de 90. A retomada realizada em 1999 é divisor de águas para demarcação e homologação em grande parte do território, e como conseqüência surge uma série de ameaças e violência contra os Truká. Além do embate com posseiros, o Povo representa forte resistência contra grandes projetos desenvolvimentistas, como a transposição do rio São Francisco, onde o território Truká encontra-se invadido pelo Exército brasileiro, e as barragens de Pedra Grande e Riacho Seco, que poderão trazer grandes impactos para a região ("Tudo isso é uma serpente. A cabeça tá nos nossos irmãos Truká e Tumbalalá; aqui, no Povo Anacé, está o rabo que é onde tá o pior veneno" - João, do povo Anacé, do Ceará, referindo-se à transposição).

É nesse contexto da resistência heróica às fortes pressões imprimidas contra esta comunidade que se inserem os motivos e interesses que envolvem o assassinato de Mozeni Araújo, assim como foi o brutal assassinato da liderança Truká Dena e de seu filho Jorge, com apenas 17 anos, no dia 30 de junho de 2005, estes assassinados por 4 policiais militares que estavam à paisana.Dena como Mozeni eram lideranças importantes nos períodos das retomadas de terra.

Quando não são assassinadas, as lideranças são vítimas de um sistemático processo de criminalização com o forte aval de segmentos do Estado brasileiro, principalmente, no caso do povo Truká, por agentes policiais e pela promotoria local. Os caminhos da criminalização e violência se estendem a outros povos indígenas no Nordeste e no Brasil, destacamos: Xukuru de Pesqueira, os Indígenas da Raposa Serra do Sol, os Guarani em Mato Grosso do Sul, os Cinta Larga em Rondônia e os Pataxó e Pataxó Hã-Hã-Hãe na Bahia.

"Nós que somos lideranças corremos este risco. Vivemos num País sem lei.. Aqui se tira a vida de uma pessoa como se matam os passarinhos, principalmente em Pernambuco. É preciso que o mundo possa nos ajudar. Hoje se não bastasse matar nossas lideranças ainda tem o processo de criminalização. Vivo cercado de dois seguranças, sobretudo depois que sofri um atentado e morreram dois jovens que andavam comigo". (Marquinhos Xukuru ao desabafar e lembrar de seu pai - Xicão Xukuru - que teve sua vida ceifada por pistoleiros).

Há quinhentos anos que os povos indígenas são violentados nas terras do Brasil. Escravizados, perseguidos e mortos, tiveram que silenciar por séculos suas identidades indígenas como estratégia de sobrevivência. É visível o nível de vulnerabilidade das lideranças indígenas, constantemente ameaçadas e mortas; a força do modelo político-econômico que violenta seus direitos; a impunidade sobre os crimes contra lideranças; a demora nos processos de demarcação e titulação-posse dos territórios indígenas, como é o caso dos Truká e dos Tumbalalá, aceleram ainda mais acontecimentos dessa natureza, apresentando-se como uma verdadeira estratégia de vulnerabilizar, desgastar e intimidar a luta dos povos indígenas.

"Hoje a gente sofre, com essa dor, mas tudo que Mozeni foi para o povo Truká, nós não vamos deixar cair. A história do povo Truká continua. Hoje tão matando o nosso povo, mas não vão conseguir. Como fez o seu avó Acilon Ciriaco, Mozeni deixou seus filhos, deixou seu povo e nós não vamos desistir não." (Pretinha Truká).

MOZENI ARAÚJO era um homem de natureza terna e pacífica. Conhecido pela forma ponderada com que lidava com a intensidade dos conflitos iniciou muito jovem como liderança, construindo-se nas lutas pela retomada de seu território, em seguida, trabalhando como agente de saúde comunitário. Também era agricultor, logo cedo entrou na luta em defesa da terra, da água e do Povo Truká. Foi Vereador e atualmente era militante do PT e candidato a Vereador. Sua história não permite que os Truká se calem e sua passagem para o Reino dos Encantados nutre em seus herdeiros a força dos maracás.

Nós, diante deste crime repugnante, manifestamos nossa indignação e principalmente nossa solidariedade com a família de Mozeni Araújo e com o povo Truká. Exigimos as devidas investigações sobre os crimes cometidos e que os responsáveis respondam pelos seus atos. Exigimos que o Estado Brasileiro supere a violência neocolonizadora e venha garantir em sua integralidade os direitos fundamentais dos povos indígenas determinados nos tratados internacionais e legislação nacional.

Neste momento de dor, buscamos lembrar o que aprendemos com o povo Truká: seu grande espírito de luta!

NO REINO DE ASSUNÇÃO, REINA TRUKÁ!

ASSINAM ESTE DOCUMENTO:

APOINME, Articulação Popular do São Francisco, Articulação de Mulheres Trabalhadores da Pesca do Estado da Bahia, Articulação do Semi-Árido, MST, Movimento dos Pescadores da Bahia, MAB, MPA, NECTAS-UNEB, CPP, CPT, CIMI, AATR, IRPAA, AGENDHA, CENTRO MACAMBIRA, SINTAGRO, CONSEA – Petrolina, Centro de Cultua Luiz Freire, Plataforma DhESCA Brasil.